Há estimativas positivas, mas, pelo histórico dos anos anteriores não dá para cravar avanços significativos
ADAMO BAZANI
O ano de 2024 foi marcado por novidades e velhos problemas nos diversos segmentos de transportes de passageiros e, para 2025, as estimativas são de avanços, mas pelo que se viu dos anos anteriores, muito aquém das necessidades do principal integrante da mobilidade: o passageiro.
São vários os temas e a análise seria longa demais, por isso, o Diário do Transporte, sem desmerecer os diversos aspectos da mobilidade, comenta alguns eixos importantes e abrangentes.
Marco Regulatório, Tarifa Zero e custeio dos sistemas:
Nos transportes urbanos e metropolitanos, foi-se mais um ano sem a definição do tal “novo marco regulatório”, que seria um conjunto de normas e leis que modernizaria os arcaicos contratos de operação dos ônibus nas cidades. Estas regras poderiam achar novas formas de financiamento dos transportes públicos que não sacrifiquem apenas os usuários pagando tarifas que, ao mesmo tempo são altas demais para o passageiro e insuficientes para custear os serviços. Também não recairia tudo nas costas dos subsídios. E no debate do financiamento dos transportes, incrivelmente, entra a Tarifa Zero. O que antes era visto como vilão, acabou sendo a solução para muitos sistemas de transportes que estavam perdendo demanda de usuários. São mais de 100 cidades brasileiras que adotam algum tipo de gratuidade para todos os passageiros, mesmo que em determinados dias da semana, como aos domingos. Mas em alguns dos municípios, o sinal amarelo acendeu, como Caucaia, no Ceará, cuja empresa responsável pela operação dos ônibus alegou que a prefeitura devia R$ 14 milhões pelos serviços. A empresa, Organizações Guimarães, chegou a anunciar que não operaria mais o Tarifa Zero, mas a prefeitura garantiu regularizar a situação. Em Ribeirão Pires, na Grande São Paulo, a prefeitura reduziu a abrangência do Tarifa Zero para todos os passageiros, diminuindo a faixa horária aos domingos e excluindo feriados da gratuidade. O sistema na cidade é operado pela Suzantur. A alegação se baseou nos custos do programa e no vandalismo contra os ônibus, ainda mais no período da noite.
Trilhos, Concessões e PPPs
Em relação aos transportes sobre trilhos, o Brasil pouco avançou em 2024 e, para 2025, a malha também vai crescer abaixo do que as cidades precisam. Com obras caras e lentas, a questão não reside apenas em financiamento, mas na carência de bons projetos. É em PPPs (Parcerias Público Privadas) que estão as apostas de administrações estaduais para os avanços dos trilhos. Mas mesmo assim, ainda há problemas. Até mesmo as PPPs e concessões têm sido problemáticas. Por exemplo, as linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, do transporte metropolitano da Grande São Paulo, concedidas à ViaMobilidade, ainda deixam a desejar no quesito qualidade – não que as operações das linhas públicas sejam exemplares. As obras da linha 6-Laranja de metrô em São Paulo, também uma PPP com a Linha Uni, concessionária liderada pela espanhola Acciona, avançam de forma lenta e não só isso, cheias de problemas graves, como desmoronamentos, crateras e deslizamentos, principalmente por onde passam as tuneladoras, os famosos tatuzões.
Transportes Rodoviários Interestaduais:
No transporte rodoviário interestadual, em 2024, aparentemente os avanços foram maiores e devem continuar em 2025. Isso porque, apesar de contestações e, talvez longe de ser o melhor modelo, o marco regulatório e as novas normas da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), deixam ao menos as regras mais definidas. O momento é de abertura de janelas extraordinárias para as empresas solicitarem linhas e mercados. Permanecem, entretanto, as críticas sobre as regras não permitirem muita competitividade e, no fundo, os grandes grupos empresariais ainda continuarem a ser privilegiados. Ainda no transporte rodoviário, realidades de 2024, devem continuar em 2025, como as brigas entre grupos empresariais, que tomam os tribunais e ações e recursos. Um dos exemplos mais emblemáticos são as disputas entre tradicionais e gigantes grupos, como o Comporte, Garcia e Águia Branca, de um lado, e de outro, a Suzantur, do ABC Paulista e operadora de linhas urbanas, pela malha correspondente ao Grupo Itapemirim, que chegou a ser o maior do setor rodoviário da América Latina e teve uma falência vergonhosa em 2022, sob suspeitas de fraudes e crimes falimentares. Outros grupos tradicionais também são envoltos em crises, como o TTT, da Transbrasiliana, que teve falência decretada em novembro de 2024, e a Expresso Gardênia, de Minas Gerais, que luta para tentar se reerguer.
Descarbonização e Ônibus Elétricos:
Sobre tecnologia e meio ambiente, no balanço de 2024 e perspectivas para 2025, não há como não falar em descarbonização dos sistemas de ônibus Brasil afora. Por mais que haja mais de uma alternativa, como gás natural, biocombustíveis e novos combustíveis sintéticos, os elétricos foram consagrados os queridos no debate; seja pelas reais vantagens, seja também pelo apelo midiático. Nas cidades de diferentes regiões e dos mais variados portes, há ainda mais discursos que ações concretas. As iniciativas que existem são pontuais e pequenas, mas trazem lições. Isso porque, mudar qualquer matriz energética é caro e surgem entraves estruturais e tecnológicos até uma determina solução se consolidar.
O Governo Federal parece ter tentado agora o protagonismo da descarbonização e anunciou vultuosas verbas. Somente pelo PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, em maio de 2024, foram propagandeados recursos de R$ 10,6 bilhões, para 2,5 mil ônibus elétricos e quase três mil a diesel Euro 6, além de composições metroferroviárias.
Mas faltam projetos na cidade.
A capital paulista, a maior promissora na eletrificação, decepcionou em 2024.
E o problema não é falta de dinheiro na cidade de São Paulo, mas de infraestrutura, planejamento e gestão. A prefeitura conseguiu linhas de financiamento e paga às empresas de ônibus a diferença de preço entre os modelos a diesel e os elétricos, que custam três vezes mais, em média.
Em 2021, no Plano de Metas, a prefeitura estipulou que até 31 de dezembro de 2024, estariam circulando na cidade de São Paulo 2,6 mil ônibus elétricos, o que representa cerca de 20% da frota total de, aproximadamente, 13 mil coletivos das empresas que operam as linhas municipais gerenciadas pela SPTrans (São Paulo Transporte).
Faltando poucos dias para o fim de 2024, e do prazo para o cumprimento do Plano de Metas, a cidade tinha apenas 491 coletivos movidos a eletricidade, ou seja, 3,8% de toda a frota. Destes 491 ônibus, 201 são os trólebus, que estão há vários anos no sistema.
Em relação aos ônibus com baterias, que diferentemente dos trólebus não precisam estar conectados à rede aérea de fiação enquanto rodam, são apenas 291 veículos, número que representa somente 11,2% da meta e apenas 2,2% de toda a frota de coletivos das linhas municipais.
Desde 17 de outubro de 2022, as empresas de ônibus da cidade de São Paulo estão proibidas, por meio de uma circular da SPTrans (São Paulo Transporte), de comprar modelos a diesel.
Mas esta proibição pode cair.
Passou em segunda votação, em 18 de dezembro de 2024, o PL (Projeto de Lei) 825/2024, do presidente da Câmara Municipal, Milton Leite (UNIAO), que a altera a atual lei em vigor desde 2018, que prevê reduções de emissões pelos ônibus da cidade.
Entre as propostas está a inclusão da obrigatoriedade de as empresas de ônibus em 90 dias fazerem relatórios e estudos sobre a necessidade de infraestrutura de cada pátio. A ENEL (no caso dos ônibus elétricos) e a COMGÁS (no caso dos veículos a Gás Natural) terão outros 90 dias para concluírem os projetos de infraestrutura para as garagens com base nestes relatórios das viações. Enquanto as infraestruturas são construídas, pela proposta, as viações poderão comprar 50% de modelos a diesel entre os novos ônibus que colocarem para rodar.
Relembre:
Mas uma das críticas sobre o projeto foi em relação a falta de transparência e debate da proposta que foi apresentada em 03 de dezembro de 2024 e aprovada em tempo recorde por quatro comissões e em primeira votação na Câmara, menos de 24 horas depoi,s no dia 04 de dezembro.
O assunto só foi de amplo conhecimento após de, na noite de um sábado, 07 de dezembro de 2024, o Diário do Transporte ter noticiado o Projeto de Lei de Milton Leite. Desde então, o PL ganhou novas versões de texto, nos dias 09 e 16 de dezembro, até ter o substitutivo aprovado em 18 de dezembro de 2024.
A pouca divulgação da versão do PL aprovada em primeira votação pegou até mesmo o prefeito Ricardo Nunes de surpresa, que não se agradou da condução do processo, uma vez que a eletrificação da frota é uma de suas bandeiras da gestão.
Há tantos outros temas da mobilidade que ainda precisam ser abordados, mas em linhas gerais, estes são alguns dos grandes problemas enfrentados em 2024 e que devem ser desafios em 2025.
FELIZ ANO NOVO
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes